quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Sobre o Freyfaxi e Hrafnkell Freysgoði.

O conto que segue é uma sinopse de uma saga em 20 capítulos que sintetiza a história de Hrafnkell Freysgoði e de seu cavalo Freyfaxi. Esse texto não se resume apenas a origem do nome do Blót do Freyfaxi, ele também traz uma reflexão sobre juramentos, weregild (indenização), orlog, orthanc, busca por poder, fé, aguardar a ajuda dos deuses e a lealdade dos humanos.

Acredito ser um texto simples e básico mas com potencial de reflexão, façam bom proveito.

Hrafnkels saga

Nós sabemos que o homem norueguês Hallfreðr que se tornou um dos colonos originais da Islândia, desembarcou na costa oeste em torno do ano 900 com seu jovem filho Hrafnkell, um garoto promissor. Hrafnkell era ambicioso e cedo – com a permissão de seu pai – estabeleceu seu próprio assentamento. Ele escolheu um vale inabitado para sua fazenda e a nomeou de Aðalból (Nobre lar). O vale subsequentemente recebeu o nome de Hrafnkelsdalr (Vale de Hrafnkell).

Hrafnkell também erigiu um largo templo e executava cerimonias de sacrifício prodigiosas. Ele dedicou o seu melhor gado a sua divindade patrona Freyr, inclusive seu cavalo favorito, Freyfaxi. Ele jurou que mataria qualquer um que montasse Freyfaxi sem permissão. Por suas atividades religiosas Hrafnkell começou a ser conhecido como Freysgoði (Goði de Freyr).

Hrafnkell ansiava por poder e logo se estabeleceu como chefe por assédio moral as pessoas dos vales vizinhos. Ele tinha uma propensão para duelos e nunca pagava weregild (indenização) por quem ele matasse.

Agora a saga introduz Einarr, um pastor de Hrafnkell. Em uma ocasião Einarr precisa cavalgar para executar seu dever, mas todos os cavalos dos quais ele se aproximava corriam dele exceto Freyfaxi. Ele então pega o Freyfaxi e o cavalga por um dia. Mas depois que o cavalo foi cavalgado, ele corre para Aðalból e o anoitecer chega. Ao ver seu cavalo sujo e molhado de suor, Hrafnkell entende o que ocorreu. Ele sai pela noite com seu machado e relutantemente mata Einarr para manter seu juramento.
O pai de Einnar, Þorbjörn, toma conhecimento da morte de seu filho e vai até Hrafnkell para pegar seu weregild. Hrafnkell diz a ele que não paga weregild a nenhum homem. Ele pensa, entretanto, que aquele assassinato está entre os piores que já fez e se prepara para fazer alguns reparos. Ele faz uma oferta aparentemente favorável para Þorbjörn de cuidar dele pelo resto de seus dias.

Þorbjörn, entretanto, quer nada menos que um acordo formal entre eles como iguais. Sob a rejeição de Hrafnkell, Þorbjörn começa a procurar por formas de alcançar a satisfação do seu desejo. As leis da Comonwealth Islandesa garantem que todos os homens livres têm os mesmo direitos – mas como não havia um poder central, um homem comum teria dificuldade em processar um chefe como Hrafnkell. Ele geralmente precisaria do suporte de outro chefe, tanto para a manobra legal complexa, muitas vezes necessária, e se bem sucedida na þing, para posteriormente fazer respeitar a decisão lá tomada.

Þorbjörn tenta ter suporte de seu irmão Bjarni, mas ele não deseja estar envolvido em qualquer conflito com o poderoso Hrafnkell. Þorbjörn vai em busca então do filho de Bjarni, Sámr. Ele, entretanto, adverte inicialmente para que Þorbjörn aceite a proposta de Hrafnkell, mas Þorbjörn se mantem firme. Sámr não tem desejo em entrar em conflito, mas após seu tio ficar deprimido ele relutantemente concorda. Sámr formalmente aceita o caso de Þorbjörn então ele se torna efetivamente o Demandante.

Sámr começa a preparar o caso contra Hrafnkell e o convoca para o Alþingi do próximo verão. Hrafnkell respeita a tentativa como risível. Quando Sámr e Þorbjörn chegam a assembleia em Þingvellir eles rapidamente descobrem que o maior dos chefes deseja ajuda-los. O deprimido Þorbjörn agora quer desistir, mas Sámr insiste que eles devem seguir não havendo outra opção.

Por uma coincidência Sámr e Þorbjörn encontram Þorkell, um jovem aventureiro de Vestfirðir (Fiordes do Oeste). Ele simpatiza com a causa deles e ajuda os a conseguir o suporte de seu irmão Þorgeirr, um poderoso chefe. Com o suporte de Þorgeirr Sámr dá procedência completa a causa. A lei tem Hrafnkell por culpado, e ele cavalga para seu lar em Aðalból. Sámr agora tem o direito de matar Hrafnkell e confiscar sua propriedade. Em uma manhã, Sámr, auxiliado por Þorgeirr e Þorkell, chega em Aðalból, surpreendendo e capturando Hrafnkell enquanto ele dormia.

Sámr oferece a Hrafnkell duas opções: primeiro execução no local; ou segundo viver como subordinado de Sámr, desprovido de sua honra e da maior parte de sua propriedade. Hrafnkell escolhe viver. Þorkell adverte Sámr que ele irá se arrepender de poupar a vida de Hrafnkell.

Sámr então toma como sua moradia em Aðalból e convida os locais para um festejo. Eles concordam em aceita-lo como seu novo chefe. Hafrnkell faz para si mesmo uma nova casa em outro vale. Seu espírito e ambição permanecem intactos, e pouco depois de alguns anos de trabalho duro ele se estabelece novamente como um fazendeiro respeitado.

Þorkell e Þorgeirr decidem entregar Freyfaxi ao seu verdadeiro dono e o arremessam de um penhasco. Eles também ateiam fogo ao templo de Hrafnkell. Ao ouvir estes acontecimentos Hrafnkell diz: Eu acho tolice ter fé nos deuses, e ele nunca mas fez outro sacrifício. Seus métodos mudam e ele se torna muito mais gentil com seus subordinados. E desta maneira ele ganha lealdade e popularidade.

Após seis anos de paz, Hrafnkell decide que a hora da vingança chegou. Ele recebe notícias do irmão de Sámr, Eyvindr, está viajando perto com pouca companhia. Ele pega seus próprios homens e parte em ataque. Sámr toma notícia da batalha e imediatamente cavalga em direção ao conflito para ajudar seu irmão com um pequeno contingente. Eles chegam tarde demais.

Na manhã seguinte Hrafnkell surpreende Sámr quando o mesmo dormia e oferece a ele as mesmas opções que foram dadas a Hrafnkell seis anos antes, com nenhum weregild pela morte de Eyvindr. Como Hrafnkell, Sámr também escolhe viver. Hrafnkell toma novamente residência em Aðalból, sua antiga casa, e volta a ser o chefe local.

Sámr cavalga para o oeste e procura o auxílio de Þorkell e Þorgeirr, mas eles dizem que ele deve amaldiçoar a si mesmo por seu infortúnio. Ele deveria ter matado Hrafnkell quando teve a chance. Ele não iriam ajudar Sámr em outro derramamento de sangue com Hrafnkell mas oferecem a ele uma residência em suas terras. Ele recusa e cavalga de volta a sua casa. Sámr vive como subordinado de Hrafnkell pelo resto dos seus dias e nunca alcança sua vingança.

Hrafnkell por sua vez, vive como um respeitado líder até encontrar um fim tranquilo, Seus filhos se tornam chefes após sua morte.

- Tradução livre: Heiðið Hjarta.

Pois bem, esta como muitas outras sagas nos mostram como as coisas eram resolvidas, como os valores eram diferentes e como o mundo mudou. Eu me interessei em apresentar este resumo da saga pois traduzi-la por completo seria um trabalho muito elaborado e demandaria muito tempo onde poderia dar acesso a outros assuntos para vocês. De qualquer forma, não deixa de ser menos interessante e talvez desperte em você a vontade por traduzir esta saga ou conhecer outras, fica a sugestão. Aqui temos uma noção do quanto querer ser ambicioso sem repartir a prosperidade alcançada pode ser prejudicial para si. Alguém muito gordo não corre de muitos lobos sozinho. Espero que tenham aproveitado, tenham um bom feriado por aqui e que as suas celebrações de Freyfaxi tragam prosperidade e sejam proveitosas. Far vel!

“ᚠ Feoh byþ frofur fira gehwylcum;
sceal ðeah manna gehwylc miclun hyt dælan
gif he wile for drihtne domes hleotan.”
(Anglo-Saxão)

A riqueza é um conforto para todos os homens;
Apesar de que todo homem deva concedê-la livremente;
Se ele deseja ganhar honra aos olhos do senhor.

“ᚠ Fé vældr frænda róge;
føðesk ulfr í skóge.” 
(Norueguês Antigo)

A Riqueza é a fonte da discórdia entre parentes;
 o lobo vive na floresta.

“ᚠ Fé er frænda róg
ok flæðar viti
ok grafseiðs gata
aurum fylkir.” 
(Islandês Antigo)

A Riqueza é a fonte da discussão entre parentes;
o fogo do mar; e o caminho da serpente.


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