sábado, 26 de março de 2016

Hamr – Mapeamento da Alma

Boa Tarde nobres leitores, o texto que segue já circulou por alguns blogs e sites na Internet e inclusive se encontra em alguns grupos e páginas de redes sociais. Ele foi inicialmente disponibilizado graças a um antigo heathen chamado Wagner Cruz que tinha um portal chamado O Troth que muito me ajudou em minhas buscas e pesquisas quando levei meus estudos sobre a espiritualidade mais a sério junto com demais fontes da internet e listas de discussões do Yahoo. Esses conceitos que seguem são elementos que fazem parte do nosso ser junto ao universo da nossa espiritualidade e assim como os egípcios antigos que cultuavam vários deuses, podemos observar que o nosso corpo espiritual é multifacetado, havendo componentes que são oriundos de nós e outros que nos são herdados e por sua vez outros que deixaremos de herança, além do mais há também entidades que nos acompanham na complementação de nossa existência exercendo efeitos fundamentais para auxiliar a manter nossa contínua sobrevivência e evolução. Trata-se de um texto que considero importante e entendo que seja bom que venha a ser observado novamente.

Manterei o texto como na forma original sem adições minhas ou correções ortográficas no que tange a variação de palavras de língua estrangeira na intenção de que cada indivíduo busque uma pesquisa própria dos termos e que leve a questionamentos que possam evoluir seu entendimento do conteúdo. Nas próximas postagens, conforme minha disponibilidade, tentarei dedicar uma atenção a cada aspecto abordado dentro deste texto, separadamente ou conjuntamente. Boa leitura e espero que o que segue desperte uma maior curiosidade em vocês, Far Vel!

- Heiðið Hjarta.

Hamr – Mapeamento da Alma


A compreensão da alma consiste na fabulosa tarefa de auto desvendar você mesmo, para, então, olhar através dos véus ilusórios da realidade (o qual nossa alma, nosso ego, nosso pensamento sempre filtra e cria sua própria perspectiva de mundo). Além do sentido de espiritualidade que envolve a leitura e compreensão da alma, também podemos sintetizar através do estudo e da experimentação da retaliação (do separar de todas as partes da alma) da inexistente individualidade egoísta que comumente acreditamos possuir. Não somos centros de nada, nem somos como que deuses. Somos apenas uma manifestação da natureza, um feito da vontade do mundo em suprir suas próprias necessidades biológicas.

A alma nada mais é do que o somatório de atributos etéreos, físicos, dons, habilidades e outras características que às vezes são unicamente nossas e outras vezes são compartilhadas por nós com outros seres, etc.

Este mesmo estudo sobre as subdivisões do ser é fruto da reunião de conceitos aferidos por durante séculos pelos povos germânicos de grupos diversos. Se alguns chamavam a alma de Hamr (forma) ou se outro acreditava somente na Fylgja (acompanhante), para nós, pesquisadores religiosos, hoje, é indiferente, pois interessa-nos somente o objetivo e a síntese desse sistema. Através da analogia sistemática dos conceitos espirituais de diversas tribos germânicas podemos partir do pressuposto que existem diversos atributos que formam o que provavelmente acreditamos ser a alma, o espírito, consciência, inteligência ou como melhor aprouver.

Assim, interligando seus atributos como uma rede de elementos necessários entre si, tiramos em um resultado que é o que chamaremos (por um motivo de identificação cultural e religiosa) de Hamr, que segundo os germanos significava “forma”, e esses povos usavam o termo para se referir ao seu espírito.
   
A ideia de “nada” era incabível entre os nórdicos. Todo espaço era ocupado e não havia uma divisão entre o mundo dos vivos e o dos mortos, ou com qualquer outro mundo. Todos os mundos eram acessíveis de mútuo convívio. Nada de dimensões astrais ou planetas, etc. Nada disso. Os mortos conviviam no mesmo mundo que os vivos, às vezes iam para outros lugares mais longes como o Hel, Asgard, etc. A morte nunca era tida como uma aniquilação absoluta, mas sim como uma passagem: a consciência, a alma transcendia seu espaço físico e passava a ocupar um lugar de tutora do clã e auxiliar do mesmo. O renascimento poderia existir, bem como poderia não ocorrer dependendo de determinadas condições como vontade e outras imposições espirituais. O nome de um ancestral, quando perpetuado dentro da família, era tido como o renascimento daquele ancestral em um novo corpo, uma forma de chamar sua presença à vida novamente.

Usaremos nesse estudo de várias nomenclaturas e elementos diferentes que aparecem através dos mitos, sagas e outras referências históricas sobre as crenças espirituais dos povos nórdicos.

Hamr pode ser decomposta em oito essências principais (obviamente suas subdivisões são muitas). São elas AthemFerthFylgjaLikhMágnMódr e Önd. Descreverei eles abaixo:

1 – Athem – O corpo etéreo, nossa manifestação no mundo espiritual; é a forma e aparência fantasmagórica. É o nosso Athem que enviamos através das experiências mágicas, xamânicas, como o Seidr e o Spae; é também o Athem que vemos nas aparições, assim como é ele que se junta à Caçada Selvagem de Odin, depois de nossa morte, nos invernos. Quando morremos, o Athem é separado do corpo e aguarda a chegada da Caçada Selvagem (que o levará junto para as hostes de almas). Quando ele não se separa do nosso corpo, fica preso em Midgard por algum motivo, ele é chamado de Draukkar (que quer dizer “morto-vivo” ou “vampiro”, “zumbi”, etc.), uma vez que irá vagar preso neste mundo por motivos diversos, que podem variar da vingança até o desconhecimento da morte.
   
2 – Ferth – Mente. É um dos presentes dos deuses no ato da criação; significa “mente/razão”. É aquilo que rege as cabeça e tudo aquilo é regido por ela. Refere-se principalmente ao pensamento, à razão e à vontade. É onde ficam armazenados nossos pensamentos, nosso raciocínio, nossas experiências, nosso saber, nossa memória.  O Ferth divide-se em duas partes: Hügr e Münr.

2.1 – Hügr – Pensamento. É o intelecto ativo, a vontade, o pensamento. O Hügr é uma das mais fortes expressões da alma, pois ele é o pensamento ativo, nossa mente no volante das ações. Através do Hügr podemos ultrapassar fronteiras físicas ao desconhecido e, por isso mesmo, pelo poder que a compreensão pode gerar, ele nos conecta ao mundo. Todo o mundo está interligado através do Hügr, assim como todos os seres estão conectados através do Fjör. A crença pagã diz ainda que o próprio mundo possuía um espírito próprio, também chamado de Hügr. O Hügr pode ser compreendido se dividido em duas partes: Angit e Sefa.

2.1.1 – Angit – São seus sentidos e percepções. Os portais do corpo por onde entra a informação e por onde podemos perceber o mundo. Funcionam como um filtro de informações. Se eles não existissem, ficaríamos loucos com tanta informação que receberíamos e não conseguiríamos associá-las com destreza. A percepção se dá pelo cheiro, gosto, tato, visão e audição. É essa percepção a principal causa de nossa equivocada e individual percepção da realidade. Nunca perceberemos a realidade e a verdade, mas sim apenas uma parcela dela, ou seja, apenas aquilo que podemos conceber através do que conhecemos e dentro dos limites de nossas simples percepções.

2.1.2 – Sefa – É o raciocínio imediato, sagacidade. Depois que o Angit percebe o mundo, o Sefa é responsável por associar os pensamentos uns com outros e assim gerar a informação. É a percepção do mundo já realizado. Se, por exemplo, percebemos através do Angit que ao tomar água ela nos queima a boca, então é o Sefa que lhe diz que ela está quente, porque associa a informação da queimadura com a informação do calor, transformando assim tudo em um pensamento: “a água está quente, devo evitá-la”. O Sefa funcionará desde os níveis físicos mais simples até níveis efêmeros mais complexos, da consciência à incosciência.

2.2 – Münr – Memória. Pois se todo pensamento do Hügr precisa ser armazenado, então é no Münr que encontrará sua lotação. O Münr é compreendido melhor quando dividido em duas partes: Gemynd e Vítand.

2.2.1 – Gemynd – Memória Individual. É a memória de nossa própria vida, onde ficam guardados nossos próprios pensamentos, nosso passado, nossas lembranças e inclusive aquelas que esquecemos. Nada escapa à mente. É onde ficam armazenados nossos orlogs, e é por isso que o Münr sempre está associado ao Orthanc (que veremos logo adiante o que é). Enquanto o Gemynd é a memória individual de apenas esta existência e nascimento, o Orthanc recolhe as memórias e heranças de existências passadas, bem como o passado dos ancestrais.

2.2.2 – Vítand – Sabedoria. Através de nossas próprias experiências, deduzimos muitas coisas sobre a vida que nos ajuda a viver e a melhorar enquanto indivíduos. A reunião de todas as conclusões do Sefa fica armazenada na memória para se tornar Sabedoria. 
   
3 – Fylgja – Acompanhante. É a entidade guardiã de nosso clã, da família, de nós mesmos. Podemos tanto herdá-la, como adotá-la. Mas ninguém existe sem a Fylgja. Ela pode ser compreendida como nossos instintos mais selvagens e subconscientes. Em sua fúria e desejo por vida, a Fylgja usará de todos os artifícios para tentar perpetuar o clã e a família, como manda as leis da natureza (pois a Fylgja é a representação de toda a natureza dentro de apenas um ser) e também usará de sua desesperada vontade de viver para se focar em aspectos mundos inatos ao homem, como o desejo constante de sexo, o desconhecimento dos benefícios das virtudes ou a ira entorpecente. É independente de nossa vontade e ao mesmo tempo é o nosso reflexo selvagem. A Fylgja é movida por instintos que beiram a bestialidade (não é a toa que é representada por um aspecto animal ou por um humano em bestialidade). Se não controlada, moderada ou disciplinada, a Fylgja poderá tomar a frente da vontade do indivíduo, acarretando vícios para este e posteriormente a decadência do mesmo. O sexo será um desejo constante, da mesma maneira, uma vez que a Fylgja buscará incessantemente questões de sobrevivência em todos os aspectos da vida, colocando a paixão ardente acima da sanidade do próprio ser. O medo da morte lhe é desconhecido, pois não sabe o que é morrer, mas saberá instintivamente quando a morte se aproxima e irá associar isso com a dor, e por isso, na tentativa de afastar toda dor, ela lutará de todas as formas, inclusive criando ilusões sobre como o indivíduo perceberá a realidade (por beirar a bestialidade, deixar a Fylgja tomar a vontade significa se entregar à ignorância e ao sofrimento posterior). Sua tática de defesa sempre será a ira, a ignorância ou repúdio, que acontecerão através de “explosões”, buscando sempre romper com a harmonia que o homem construiu para sua alma. Esta é uma visão bastante pessimista da Fylgja, mas é o que ela nos representa em sua mais profunda intimidade. Os povos germânicos acreditavam que ela habitava a nossa sombra, e por isso nosso seguia ou nos guiava. Mas, nem de todo a Fylgja é algo ruim, uma vez que ela é responsável por estarmos aqui vivendo e nos ajudará em muitos momentos de dificuldade como uma forma de defesa, ataque ou cura imediata para questões diversas. Desde que controlada, a Fylgja será extremamente útil. Nos auxiliará em questões de magia, assim como também poderá nos ensinar a viver através de pequenas lições. Como um animal que habita nossa alma, devemos domá-la e saber como usar dela para o bem, ao invés de deixar que ela use-nos em prol de suas próprias necessidades naturais. Se deixarmos que isso ocorra, que ela nos tome a alma, então seremos apenas bestas às margens da sociedade ordinária. A Fylgja pode ser tanto representada visualmente como um animal de poder, como uma besta, como um ser humano tocado por bestialidade ou selvageria, ou mesmo poderá ser simbolizada por algum espírito antepassado. Para compreender a Fylgja melhor, podemos também dizer que ela está associada a outras três essências: Hamingja, Dísir e Aettarfylgja.

3.1 – Hamingja – Hamr + Fylgja. Forma acompanhante. É a fusão de nossa alma com nossa Fylgja. Usada em trabalhos xamânicos, é útil ao transe, permitindo que ela tome controle de uma parcela de nossa vontade, e assim possamos utilizar de seus atributos mágicos, como a cura, a visão, a viagem, a força, a ira, a rapidez, a lucidez, etc. É esta a forma que os Berserker ou Ulfedhnar usavam em batalha, mantendo uma parcela de seus espíritos sempre conectada com sua Fylgja. Esta crença de que saímos do corpo e que tomamos outras formas talvez remeta ao contato dos escandinavos com os lapões. Há menções de formas específicas além da Hamingja como o homem transformado em lobo (Hamrammr, Rammaukin, Eigi Einhamr).

3.2 – Dísir – Ancestrais Femininas. Dísir é o coro espiritual que assiste ao clã. São as ancestrais mulheres que morreram e agora regem pela sobrevivência e proteção das famílias, tribo, etc. Em geral, nos referimos a esses espíritos como Dísir, ou Idísir (singular Dís ou Idísa), mas elas podem assumir outros aspectos, em outros contextos. É dito que podem ser chamadas também de Walkyrjor (Valquírias) ou ainda de Norn (apesar de muitos defenderem que as Valquírias e as Nornes compunham um grupo diferenciado de divindades). São Walkyrjor quando devem reger assuntos de grande importância como a morte, a vitória na batalha e outros assuntos relacionados a Odin. E são chamadas de as três Norn quando precisam reger aspectos do destino, como os orlogs por exemplo. Mas esta é uma concepção individual de como encarar a existência das Dísir. Pessoalmente, eu encaro as Dísir, as Walkyrjor e as Nornor como corpos espirituais diferentes.

3.3 – Aettarfylgja – Familiar. É o espírito tutelar da família, aquele que é transmitido através do sangue, obrigatoriamente. Este não pode ser escolhido, uma vez que ele é herdado pela família, por seus ancestrais. Acompanhará a sucessão familiar e a protegerá contra seu extermínio. A Aettarfylgja é a uma Fylgja mais complexa com uma forma efêmera que pode se dividir em Fylgjas “menores” e individuais para cada pessoa do clã.

4 – Lá – Sangue. O Lá é o sangue, o calor humano, o veículo de vida e poder. Na mitologia escandinava é o presente de Lódur a Askr e Embla, o primeiro casal humano. É através do Lá que há a transmissão da vida, de poderes e de todo tipo de herança física e espiritual. Os orlogs são transmitidos através do sangue e são então chamados de Orthanc (herança). Quando o sacrifício é feito, é o Lá quem dá o poder para tornar a divindade forte (os sacrifícios eram feitos para louvar e fortalecer o poder de uma determinada divindade). O mesmo acontece com o talhar das runas com o próprio sangue, pois é ali que é transferido o seu poder para as runas e então elas ganham “vida”. O Lá pode ser decomposto em três partes: Ásdr, Fjör (Wyrd) e Orthanc.

4.1 – Ásdr – É o papiro secreto que a Norn Skuld vela, onde está escrito o dia do nascimento e o dia da morte de cada ser. O Ásdr está no sangue porque é lá que acontece toda troca de orlogs entre o ser e seu meio e assim que homens e mulheres podem aumentar ou encurtar seu tempo de vida em Midgard. O Ásdr não controla apenas o tempo que viveremos aqui, mas também pode controlar nossa qualidade de vida, uma vez que as Nornor (distribuindo os orlogs) podem alterar nossa configuração social de vida. É através do Ásdr que todos os orlogs fazem-se acontecer em nossa vida. No ásdr está escrito o dia do nascimento, da morte e a se vida será levada com qualidade ou com decadência.

4.2 – Fjör – ou Wyrd. Destino. O destino nunca é visto como algo fatídico, mas sim como algo previsível dadas certas condições passadas. Nosso Fjör segue uma direção já formulada por nossos ancestrais e também por nosso próprio passado. Nossas heranças como dons, talentos, bênçãos, maldições, qualidades, defeitos, e também nossas atitudes como desonras e glórias determinam como será o Fjör. Esse mesmo Fjör está em constante processo de adaptação à nossas possibilidades uma vez que ele é o gerador dos orlogs. Um orlog é uma conseqüência, uma reação natural do mundo contra qualquer ação. Toda ação possui uma reação, e essa reação é chamada de Orlog (é aquilo que o mundo nos devolve). A semeadura é livre, mas a colheita é obrigatória. Os orlogs podem ser bons ou ruins e estamos constantemente recebendo-s o tempo todo. O Fjör é descrito nos mitos como um fio escarlate que a qualquer momento poderá ser rompido bastante que Skuld diga o dia da morte do homem. O destino é inexorável e não importa o caminho que tomamos, o que nos foi legado é nosso por direito, sem fuga.

4.3 – Orthanc – ou Ódal. Herança. Todos os orlogs e atributos de nossos antepassados, ancestrais e progenitores são passados ao nosso ser, pois não somos nós mesmos, somos apenas frutos da vontade alheia; somos a continuação dos antigos. Não escolhemos quem seremos, isto nos é imposto. Não escolhemos nascer humano, não escolhemos nosso nome, nem escolhemos nossa configuração biológica. Tampouco escolhemos nossa própria sorte de vida que iremos levar. Tudo é herdado. Se o ser humano existe é porque houve em algum momento uma vontade transcendental que desse tal impulso. E se possuímos nomes como Helga ou Erik é simplesmente porque nossos pais assim o desejaram. Igualmente, se somos saudáveis, ou doentes, se somos inteligentes ou tolos, se feios ou belos, se ricos ou pobres, é tudo uma questão de herança e destino (isso quer dizer independe de nossa vontade). Essa verdade sobre a realidade, de que recebemos uma complexa herança ao nascer é chamada de Orthanc. As glórias e maldições de nossos ancestrais também serão as nossas. Por isso a união familiar e o sentimento de fraternidade em um clã é tão importante para todos. Para ser compreendido em detalhes, o Orthanc precisa ser decomposto em seis partes: Orlog, Forlog, Mjovutdr, Auna, Gaefa e Afl Okkat.

4.3.1 – Orlog – Sob a Lei. Lei fixada nas origens. Esta lei é herdada por todos os seres e ela diz que toda ação terá uma reação. Toda destino retorna a sua origem. Esta é a lei básica dos mundos, a que nada escapa. Cada ação passada é responsável é originária de um orlog, uma conseqüência arbitrária e ordinária.

4.3.2 – Forlog – Lei fixada no avanço. Na tentativa de alterar nosso Ásdr, de melhorar nosso Fjör, podemos lutar contra o orlog e alterar nosso destino. O Forlog então é a força que geramos para mover nosso destino em outra direção diferente daquela que nos é herdada. Algumas ações excepcionais podem gerar Forlogs.

4.3.3 – Mjovutdr – Destino que está fixado desde as origens. O Mjovutdr é fardo da família. Aquilo que, desde a sua origem, as pessoas estão fadadas a carregar consigo por todas as gerações, aquilo que é imutável, como fato de sermos humanos, ou o fato de termos determinadas doenças, ou de que por toda uma geração muitos nasceram gênios, etc. É difícil decifrar o Mjovutdr, pois somente um ancião que conheça bem o Orthanc da família poderia enunciar o que faz parte ou não do Mjovutdr. O Mjovutdr pode ser composto por alguns Gaefas (ver a frente).

4.3.4 – Auna – Destino como concessão feita pelos Deuses. A vontade dos deuses é suprema e assim como transformaram árvores em seres humanos, também podem nos aniquilar. É dito que os deuses também são regidos pelas mesmas leis de destino que somos, mas são interminavelmente mais poderosos que a nossa vontade. Apesar dos deuses não interferirem na vontade dos homens, alguns deles podem ceder ao capricho e alterar a natureza das coisas. Ou ainda podem fomentar um destino completamente diferente daquele que o Fjör pretende formar, independente de como é o Orthanc. Mesmo que não faça parte do Orthanc de uma pessoa ela ter nascido como o dom para a arte, ali houve uma vontade extraordinária que alterou a predisposição das coisas, concedendo assim um Auna.

4.3.5 – Gaefa – Presente. O Gaefa é ligado ao ser durante o nascimento, pois é ali que as Dísir, ou Norn, presenteiam o novo ser com seus talentos, dons e atributos. Um Gaefa é sempre especial e todo ser possui pelo menos um. O Gaefa não poderá ser diferente daquele de sua família, mesmo que destacado, a não ser que haja um Auna contra isso. Pode ser considerado um Gaefa a beleza, a saúde, a força, a inteligência, o talento para a arte, a perícia com as mãos, etc (também há Gaefa de cunho mágico). O Gaefa se confunde com o Mjovutdr por serem ambos heranças ancestrais. Para desmistificar isso podemos dizer que os Gaefas são partes menores do Mjovutdr, se este último pudesse ser decomposto.

4.3.6 – Afl Okkat – Nossa força. É o somatório das glórias conquistadas por uma família, tribo ou clã que juntos se transformam em força efêmera e propiciam a sorte, a prosperidade e a vitória em muitas questões da vida, inclusive garantindo a imortalidade da alma entre os heróis. Esse dote faz parte do Orthanc porque é uma herança dos ancestrais a todas suas gerações. Todo membro de um clã sempre contribui para fortalecer ou enfraquecer o Aett Afl Okkat (A força do clã).

5 – Likh – Corpo. Obviamente é o corpo que faz parte da Hamr e não o contrário, uma vez que somos a forma pensada pela vontade dos deuses. O Likh é a configuração física, corporal que assumimos para que a Hamr possa habitar. A saúde do Likh é de suma importância para o bem estar da Hamr. Está unido à Hamr através do Mágn.

6 – Mágn – ou Meginn. Força, Poder. Está relacionado à saúde, e a força física. É o Mágn que mantém a alma presa ao Likh e a mantém ali longe do perecimento. Se ele pudesse ser visto seria brilhante e ardente como o fogo, semelhante à “aura” que os orientais pregam.

7 – Módr – ou Máttr. Bravura, Coragem. O Módr é uma emoção adormecida que em certas horas de descontrole, ira, ódio, loucura ou paixão desperta elevando o ser acima de sua própria capacidade. Poderíamos dizer que o Módr eleva o nível de adrenalina no corpo de tal maneira que superaríamos nossa própria capacidade de força. Por isso tal bravura, pode ser literalmente traduzida como “ira”. Nas Eddas dize-se que quando Thor lutou contra a serpente de Midgard, ele invocou o seu Jöttunmódr (Ira de Gigante ou Bravura de Gigante) para poder elevar a gigantesca serpente acima de si, conjurando para si sua herança jottun por parte de mãe.
     
8 – Önd/Od – Respiração/Inspiração Divina. Em uma das Eddas, Önd é um dos presentes dos deuses, o que foi ofertado por Odin ao primeiro casal de humanos. Através da respiração concebemos a vida e sem ela não vivemos. Através da respiração nos comunicamos também como o mundo exterior, uma vez que inalamos coisas para dentro de si. Pode ser dito que o önd é o sopro divino, a última parte da alma e o elemento necessário para que haja vida. É o önd que nos diferencia dos seres mortos, dos fantasmas, etc. Quando o önd se desfaz, nós morremos. Por ser a respiração o ato de atrair para dentro de nós a força dos deuses é dita ainda que é a inspiração divina (Od). Em outra Edda ela é chamada de Od, uma força soprada por Ódin aos homens, que lhes dá atributos extraordinários para o hedonismo e o prazer, como a poesia, a música, a paixão, a ira, a risada, etc. O Önd/Od é a parte mais complexa de se compreender por ser um atributo ao mesmo tempo efêmero (inspiração divina) e físico (respiração). Diz-se que o Od permeia todas as coisas e podemos respirá-los quando bem quisermos desde que tenhamos consciência disso.

  
Juntamente com nossa Hamr também anda, lado a lado, o Frith que é a paz, mas não a paz no sentido da guerra, mas sim a paz no sentido da ordem, da felicidade, da tranqüilidade, do bem-estar do kindred. Talvez este seja nosso objetivo consciente em vida, atingir o Frith. A meu ver não há outro sentido senão buscarmos o Frith e estarmos satisfeitos com nosso Ásdr. Frith e Ásdr são como irmãos.
  
Existem três fontes que geram friths, e são elas: Kenship (parentesco), Healldream (“alegrias do salão”, que são os atos de lealdade, entre duas partes) e Frithyards (que é o relacionamento do humano com suas divindades). O relacionamento social entre os seres humanos é a principal fonte de Frith, mas não a única. A individualidade e a solidão também sabem mostrar o Frith através da temperança e da disciplina.
  
O Kenship, é a principal fonte de Frith, nossa família, nosso clã, nosso irmãos, pais, avós, primos, esposas e maridos, o Sippa em si, são as coisas mais importantes em vida para nós e por isso precisamos estar em paz com eles, protegê-los, guiá-los no Ritta (Lei Cósmica) e assim alcançar a felicidade e a paz. Sippa é a principal fonte de Frith, que é a família. Ritta é a lei cósmica do universo que fala como devemos perceber a realidade como apenas um ponto de vista e sobre nossa condição humana de lutar contra o sofrimento.

O Healldream se refere aos atos de lealdade entre um líder e seu povo, entre um mentor e um aprendiz, entre um senhor e seu servo, entre um vassalo e um suserano, entre um Jarl e um Karl, entre um amante e sua parceira(o). A lealdade garante a amizade, a confiança, a honra, a bravura e por isso faz aumentar nosso Ásdr, e logo gera Frith.

E finalmente o Frithyards que se refere ao relacionamento que uma pessoa têm com os seres divinos e vice-versa. Crer e cultuar uma divindade traz paz, segurança e respostas para perguntas universalmente questionáveis, e as divindades se agradam disso provendo fartura, fertilidade e paz, o que também é fonte de Frith.

- Texto original de Wagner Cruz disponibilizado no antigo portal O Troth.

sexta-feira, 18 de março de 2016

Mas aonde você quer chegar?

Bom dia nobres leitores. No último texto fizemos uma breve análise sobre quem foi e quem é Óðinn observando as suas mudanças e as características da sua evolução dessas mudanças no decorrer da sua participação junto aos Æsir, e claro quem ele será não cabe a nós, mas somente a ele e ao destino decidir. Refletindo sobre sua trajetória o observo como um bom exemplo do caminho que percorremos, sobre quem fomos, quem somos, quem queremos ser e quem de fato seremos, dentro e fora da nossa espiritualidade, seja em um dos vários desmembramentos religiosos desta espiritualidade ou em nenhum deles. Então ainda que de heathen para heathen, de família para família e de kindred para kindred as prioridades sejam diferentes, uma coisa todos temos em comum, um ciclo de anseios marcados por objetivos a seguir, um começo, um meio e um fim, tal como na natureza que nos cerca não somos diferentes.

Em nossa natureza é comum desejarmos a busca por prosperidade continuamente em nossas vidas e por isso temos a necessidade de pontuar objetivos, entender que haverá obstáculos entre eles e ao alcançarmos encontramo-nos em um estado de espírito, mesmo que breve, de alegria pelo sucesso obtido, claro quando dá tudo certo. Porém por vezes nos vemos diante de certos desafios que nos impedem de agir, ou que a princípio pelo espanto do inesperado acreditamos ser impossível ou inviável de seguir em frente, nos fazendo cair num conformismo derrotista e enchendo o venenoso copo do ceticismo dia após dia.

Por vezes você entenderá que é maçante e difícil estudar esse ou aquele tema, que ter acesso a esse ou aquele livro pode parecer difícil, que a opinião descabida desse ou daquele heathen pode parecer a maioria te desmotivando pois você não quer ser esta maioria, que este ou aquele trabalho que você acredita acrescentar na espiritualidade recebe críticas nada construtivas ou tentam ainda sabotar ou mesmo ofuscar seu esforço, isso quando você não é mal interpretado. A impressão num desespero final chega a ser que esta ou aquela, se não todas as divindades te abandonaram, pois bem, não é por ai.

Nós sempre enfrentaremos adversidades enquanto vivos, e poucas pistas tenho de que novas adversidades não serão colocadas pelo destino ou resultadas por nossos atos ou de terceiros depois disso. E exatamente diante dessas adversidades que teremos que observar a situação atentamente e encontrar nesse labirinto o nosso caminho rumo a saída que é a solução. São em momentos de crise, pessoal ou não, que nós temos de observar o por que tal situação está ocorrendo, principalmente se ela é recorrente em nossas vidas ou não, e o que deve ser feito para sanar esse problema, por vezes trata-se de algo simples e óbvio, mas por vezes parece ser necessário se afastar da situação e tomar par si um tempo para observar melhor os fatos.

Se afastar de uma leitura, de um trabalho, de um meio com opiniões estranhas a sua forma de pensar, nada disso está errado, não é desistir de uma guerra, ou deixar se vencer por um obstáculo, mas entender que você ainda não tem todos os elementos necessários para seguir em frente e alcançar seu objetivo, talvez uma leitura prévia de um texto ou um livro, analisar o público alvo do seu trabalho e a divulgação dele, ou ainda buscar observar o comportamento de outros heathens que não tem as opiniões que te desagradam, seriam ótimas formas de te incentivar e fazer você reconhecer que não se trata de um problema sem solução, ou que as divindades se afastaram de você. Agora se ao se deparar com essa situação você optar pelo desânimo, então você escolheu a derrota, você se afastou as divindades e você deixa um obstáculo e amarga a sua tristeza por escolha própria.

Muitos heathens se desmotivam em algum momento de sua trilha, isso culminando até em alguns casos no abandono da fé ou se tornando mero participante nominal por um simples motivo, falta de um objetivo. Sem adversidade não há superação e sem superação não há vitória e sem vitória não há progresso. Essa cômoda estagnação na fé com o tempo vai te desgastar e fará você abandoná-la, não se trata de sempre ter uma nova meta, você não tem que mudar o mundo (nada de errado também se assim o quiser), talvez manter uma meta seja já algo bom o suficiente como por exemplo sempre executar os seus sacrifícios no tempo certo/possível sem deixar de fazê-los, sempre ter uma leitura em andamento, sempre estar trocando informações com os mais novos, ou buscando elas com os mais velhos no caminho.

Quando um kindred por exemplo não tem um objetivo definido eles deixam de olhar para o horizonte e começam a olhar para os lados, as imperfeições que antes não incomodavam começam a ganhar destaque uns nos outros e os indivíduos que antes trabalhavam em prol de uma harmonia coletiva, agora se vêem vítimas de constantes julgamentos uns dos outros, coisas que estavam longe de ser uma prioridade ou coisas que as vezes compete apenas ao indivíduo resolver, tudo isso ocorrendo por qual motivo? Falta de um objetivo.

Então entenda que um barco perdido sem rumo no oceano do acaso está vulnerável a toda sorte no mar da vida e o marinheiro não pode reclamar se está muito tempo sem ver terra firme ou se vive em constantes tempestades, os Æsir nada tem a ver com isso. É ter coragem e sabedoria para enfrentar o mal tempo e depois aproveitar os bons ventos. Não podemos ganhar todas as brigas, mas se nos conhecermos bem, saberemos quais podemos comprar, e aquela briga que antes era impossível agora só é um pequeno contra tempo, pois você cresceu e se tornou maior que tudo isso.

Nossa fé depende basicamente de nós, da nossa vontade de nos conhecermos, de aceitarmos que precisamos mudar e que vamos mudar, de nos ajudar na medida em que podemos fazendo aquilo que sabemos ou podemos para ajudar uns aos outros, saber observar as maçãs podres que podem estragar todo o resto e por fim lembrar que para que haja uma próxima colheita, temos que plantar agora, nosso trabalho é para as gerações futuras que um dia serão gratas a nós, como nós somos gratos a alguém, espero que tenha sido uma boa reflexão e uma boa leitura e isso tenha te ajudado de alguma forma. Mãos a obra, bom fim de semana, até semana que vem e Far Vel!

- Heiðið Hjarta.

quarta-feira, 9 de março de 2016

Óðinn - Sobre loucura e lucidez. (Revisado)

Boa tarde nobres leitores, hoje seguirei com a revisão dos antigos textos que havia publicado no finado Perturbardo (um minuto de silêncio), assim como tudo na vida, até a informação muda e o que se tem por verdade também. A medida que se caminha numa trilha seu horizonte se amplia e normalmente as opiniões de ontem não serão mais as de hoje, que também podem vir a se aprimorar amanhã, então fazer uma revisão do que se tinha por certo a anos atrás é necessário, seguiremos com as divindades e agora vamos falar, da melhor forma possível mas nunca esgotando o tema principalmente sendo ele, do irmão de Loki, ou do pai de todos Óðinn.

A princípio vamos apontar basicamente as suas principais características. Ele é descendente de Buri que não é um Jötunn, e tem como pai Borr e como mãe Bestla, essa que por sinal é filha do gigante Bölþorn, logo fruto do primeiro caso relatado de miscigenação (segura essa puro sangue). Sua primeira participação nos mitos do universo nórdico é como um guerreiro travando a primeira batalha que resulta na destruição do gigante primordial Ymir, auxiliado por seus irmãos Vili e Vé, fazendo da carcaça do gigante o mundo de Midgarðr para a humanidade e dos vermes que saiam de seu cadáver os deuses deram origem aos anões que habitam as rochas bem como a terra (acredito que esse ponto possa ser a chave para a interpretação da origem de anões e elfos também, uma vez que os deuses em Ýdalir dão a Freyr o domínio sobre Álfheim, como posso te dar lago que não está sob minha posse ou que eu não tenha feito? Mas isso é apenas uma posição pessoal, falaremos disso em outra oportunidade) voltando ao assunto Óðinn

Temos Asagrim como o chefe tribal em Ásgarðr na posição de líder dos Æsir, Junto de seus irmãos Hœnir e Lóðurr (por vezes mencionados como Vili e Vé) o Aldaföðr protagoniza a criação da humanidade através de Askr e Embla, o que justifica a figura de pai de todos nós. Além da extensa relação de filhos que tem, sendo eles basicamente no atual senso comum Bragi, Baldr, Höðr, Víðarr, Váli, Hermóðr e Þórr. 

Engraçado reparar que enquanto Freyr sendo um deus da fertilidade não têm filhos, Alföðr teria de no mínimo sete filhos até a uma lista bem mais extensa, como por exemplo no caso dos fundadores das dinastias que dão origem aos líderes tribais e consequentemente as casas reais, fora as paternidades contestadas como é o caso do corajoso Týr que sabemos ser filho do jötunn não tão corajoso assim Hymir, ou mesmo de Yngvi-Freyr que sabemos ser filho de Njörðr. Resumindo ele é o Gengis Khan dos deuses ou o Mr. Catra de Ásgarðr, caso você infelizmente não conheça o Gengis Khan.

Como uma divindade de guerras, vitórias e conquistas, Sigtýr, entra em guerra com os Vanir após Gullveig ser queimada três vezes por adentrar o salão dos Aesir, esta guerra se resolve num armistício com uma troca de reféns que por fim culmina na conclusão das divindades que habitam Ásgarðr e solidificam o panteão nórdico. Como líder guerreiro era comumente invocado para se ter vitória nas batalhas e seu papel de trazer a vitória com algum custo permanece o mesmo até hoje, sendo o domínio de Valtýr sobre a morte (afinal guerras levam a elas) evidente através dos seus guerreiros de elite Einherjar e através das Valkyrjur que escolhem entre os mortos quem serão estes guerreiros que vão habitar o tão desejado salão Valhöll, além dele próprio ter determinado para Hel a filha de Loki um lugar de mesmo nome e também de ser o líder da Caçada Selvagem.

Como uma divindade que se transforma ao longo do seu percurso, Hangatýr morre como guerreiro para renascer como sábio ao sacrificar a si mesmo, na busca pela sabedoria das runas, seu conhecimento de necromancia também permite que adquira informações sobre o futuro com uma Völva e que permita que a cabeça de Mímir possa dar a ele parte da sabedoria que precisa, outra parte vêm de seus fies corvos Huginn e Muninn que fazer as vezes respectivamente de pensamento e memória, uma vez que ele não pode estar em todos os lugares, mas busca saber do que ocorre nos nove reinos. 

Também do seu trono Hliðskjálf ele avista os nove reinos e assim sabe para onde ir e o que procurar, interessante que esse comportamento de Fjölnir ao sentar em um lugar alto para buscar ver locais distantes nos remete a práticas de Seiðr que ele teria aprendido com Freyja, conforme o próprio Loki delata. Entre os demais companheiros dele estão os lobos Geri e Freki, respectivamente que fazem a vez de consumir tudo aquilo que poderia ser alvo do desejo mas não necessariamente da prioridade de Óðinn, mesmo por este não se alimentar mais de comida que deixa para os seus lobos, mas vive de vinho conforme relatado no Gylfaginning, logo o vinho provavelmente seria a bebida mais adequada para ele em um Blót. Por fim Reiðartýr na figura de psicopompo temos ele cavalgando Sleipnir o filho de oito patas de Loki através dos nove mundos para buscar os mais variados objetivos, mesmo com toda a sua sabedoria, um deus muito mais de ação do que de palavras.

Falando em ação Váfuðr em muitas histórias é relatado como um andarilho, algumas vezes na companhia de Hœnir e Loki, outras vezes só, histórias interessantes que costumam trazer proveito para si de alguma forma, destas a busca pelo Hidromel da Poesia que pertencia ao jötunn Suttungr, mas graças a sua engenhosidade, traço marcante do comportamento de Grímnir (seja através de seus disfarces ou da forma como trai a confiança dos desavisados), ele consegue trazer a bebida para os deuses e para a humanidade me forma de poesia. Apesar de seu filho Bragi, Sviðurr é de uma sabedoria ímpar e não é muito difícil imaginar que Skalds e Líderes da nobreza busquem uma identidade maior com esta divindade que detêm em suas mãos a guerra e a morte, a realeza e os enforcados, as runas e a magia, a loucura e a poesia.

Ele começa as guerras que outros vão lutar e leva a vitória sem se expor a própria morte, ele deixa alguém tomar conta dos mortos, mas sempre participa da Caçada Selvagem, ele é um pai, mas está longe de ser caridoso e amável, mesmo sendo o pai de todos. Ele é um líder, entretanto sabe se mostrar humilde quando precisa de algum conhecimento que só outra pessoa pode conceder a ele. Ele da à vitória assim como tira a vida dos que ganharam batalhas em nome dele, ele é o deus dos nobres, mas nem só de nobres é feito seu eterno exército, ele é um guerreiro e um diplomata, um líder e um pária, ele é honrado e é traiçoeiro, um xamã revelador de verdades que se oculta em inúmeros disfarces, detentor de muitos nomes. Ele é Óðinn...

Espero que tenham aproveitado e que ajude em possíveis buscas pessoais num melhor entendimento das facetas desta complexa divindade, deixei vários nomes para que possam estudar melhor os vários lados que este Æsir apresenta, alguém que está longe de ser definitivamente resumido em qualquer postagem. Espero que todos tenham uma boa semana e até semana que vem. Far Vel!

- Heiðið Hjarta.

sexta-feira, 4 de março de 2016

As Guerras de Midgarðr.

Bom dia nobre visitante, seguindo para a oitava postagem, dessa vez sairemos um pouco do acadêmico, mas retornaremos a ele ao final da postagem, vamos falar do cotidiano. 

Dado a um evento recente, mas diria nada inovador se não apenas recorrente, e dado o direcionamento que parte do heathenismo/paganismo tem seguido ao redor do mundo, farei uma reflexão sobre nossa senda espiritual e nossa atitude em relação aos demais caminhos que nãos nos pertencem ou que os mais sensatos não buscam trilhar. O texto não busca defender nenhuma orientação político-ideológica, uma vez que nossa fé não está ligada as atuais correntes de pensamento políticos, filosóficos e econômicos que compõem esse mundo pós-moderno e seus frágeis valores. 

O evento se refere a um boletim dominical de um Reverendo de uma Igreja Presbiteriana de culto do município de Barra do Piraí no estado do Rio de Janeiro – vulgo terra do biscoito, abraços aos amigos fluminenses e cariocas, além de um alerta aos grupos de patrulha xenófobos e racistas que vêm crescendo na Europa como o mais famoso Filhos de Odin (por qual motivo eles insistem em colocar chifres nos elmos?).

Batalhas em nossa fé existem desde a criação do mundo através da morte de Ymir até o último sopro de vida do último de nós ao deixarmos Midgarðr, conforme conta as bases de um eventual Ragnarök. Temos em nossa crença exemplos claros de conflitos entre clãs como a guerra Æsir-Vanir e a nada pacífica relação constante com os Jötnar, bem como também entre as mais diversas divindades, além da própria história dos povos que nos legaram essa crença espiritual, desde sua chegada nas terras da Europa, enfrentando a exemplo Celtas e o Império Romano, até as batalhas contra a cristianização da Escandinávia contra Olaf, o Gordo (Óláfr Tryggvason). Enfim uma continua história de longos tempos de guerra e curtos tempos de paz.

Atualmente vivemos num mundo onde os conflitos políticos, religiosos e comerciais fomentam constantemente a desgraça e a alienação, fazendo com que poucos prosperem, muitos cobicem e alguns oportunistas lucrem com esse abismo entre o que é desejado e o que é necessário. Por fim vivemos em uma sociedade em que o descontentamento é crescente e todas as partes que a compõem parecem não mais se suportar, estando num espectro geral com os nervos à flor da pele, tomando tudo por ofensa e condenando a atitude do próximo sem se quer saber quem é o próximo, se a atitude é real ou se quer qual foi sua motivação.

Logo com tal cenário nos rodeando, não seria sensato pedir a vocês que sejam pessoas pacifistas - Óðinn, Þórr, Týr e Freyja provavelmente pegariam meu couro e Loki não me ajudaria nessa - pois esse pacifismo além de não funcional a curto prazo e temeroso a longo prazo, não é algo para o qual nascemos. A vida é uma luta, no mínimo pela sobrevivência, por mais civilizado que seja o mundo, então no mínimo nascemos para lutar ao menos pelo nosso lugar no mundo. Logo a questão não é sobre não lutar, mas sim pelo que lutar e contra o que ou quem lutar.

“Com leis nossa terra deve ser construída e estabelecida, e com injustiça arruinada e devastada. (Njal's Saga, c.69)”

“Cada um é senhor de suas próprias palavras. (GS, C.19)”

Quando falamos sobre cometer equívocos e sobre a inevitável responsabilidade sobre os resultados desses equívocos, entendemos que é necessário punir aquele que perturbou a paz e a ordem em nosso meio. Não há perdão, o perdão é conviver com o peso do seu erro e através dessa reparação punitiva é que podemos tentar trazer novamente alguma paz ao ofendido em meio ao povo e dar a pessoa que cometeu o erro a chance de entender a gravidade de seus atos.

Entretanto as palavras de um representante de uma fé ou mesmo os preconceitos daquele indivíduo em relação aos demais que não fazem parte da sua fé, não pode ser pretexto para condenar o pensamento e o comportamento de todo um grupo. Assim como não atacamos roteiristas e fãs da Marvel por dar uma nova interpretação cultural das nossas divindades, ou aos Wiccanos por descaracterizarem algumas de nossas divindades através da sua forma de crer nelas através do seu dualismo Deus/Deusa, ou não condenamos a nós mesmos por infelizmente existirem neonazistas entre nós, não podemos condenar todos os cristãos pelo panfleto ofensivo deste ou daquele pastor, ele está vendendo o peixe dele para cristãos desinformados, não para você que está estudado, não se iguale.

“11. A mão que quer bater espera pouco. [1] (Njal's Saga, c.133)”

“18. As noites de sangue são as noites de maior impaciência. [3] (VGS, c.8) (VA, c.24)”

Muitas são as palavras de coragem em tempos de prosperidade, mas poucos são aqueles cujas ações correspondem às palavras corajosas em momentos de aflição.

Na era digital a informação é constante e dificilmente se tem tempo de avaliar a veracidade ou o conteúdo dela, quando há disposição para isso. Logo observadores superficiais se darão apenas ao trabalho de julgar o fato pelo seu ressumado título. Então está armado um tribunal virtual “muito elucidado” dos fatos, com todo o seu direito que têm herdado de eras de “nada” dizer se isso ou aquilo é errado e o que deveria ser feito. E ai morrem os fatos, muitos uivos, latidos e rosnados, nenhuma mordida. Incitar o ódio é gerar a ignorância e usar tal força para apenas julgar algo que é desconhecido é um desperdício de força sem tamanho, se acha que algo realmente está errado, resolva. Afinal assim como o pastor imoral que tenta converter o povo ao seu discurso sem sentir na necessidade de se prender as suas próprias palavras, tal ódio propagado entre os heathens é muita coragem quando não é necessário lidar com a adversidade de fato e menos ainda com as suas consequências.

“65. Não lute contra muitos. (VS, c.11)”

“66. Melhor lutar e cair do que viver sem esperança. (VS, c.12)”

Outro fato importante é que pela nossa religião estar sendo resgatada e reconstruída aos poucos há um tímido movimento em direção de integrá-la junto a sociedade, primeiro por não sermos adeptos do proselitismo e segundo por ser muito mais fácil e cômodo estudar, ler, debater do que colocar em prática tudo que é estudado, lido e debatido e não trazer esse conteúdo prático para o seu dia a dia na forma de atos e também para a junto da sociedade. Afinal parece que a boa e velha expressão “católico da boca pra fora” não é uma exclusividade dos católicos. Logo com uma casa ainda sendo arrumada, ainda desestruturada, desunida, sem o devido suporte aos que dela fazem parte, como reclamar algo contra alguém, como desejar guerra quando não se tem sequer um exército para lutar essa guerra? 

E necessário conviver com a realidade, fortalecer a nossa fé, aproximar os kindreds, dar apoio aos heathens que estão sem suporte, mas respeitar também aqueles que preferem a solidão, expor quem são os exotéricos mal intencionados que iludem as pessoas que buscam conhecimento e orientação espiritual, é necessário sempre estar alerta as pessoas e grupos que buscam distorcer o nosso caminho com seus ideais extremistas, segregacionistas e preconceituosos, como infelizmente tem ocorrido de maneira mais recorrente na Europa e nos EUA. É necessário dar a nossa fé um aspecto cultural visível em meio a sociedade e um aspecto unificado, é necessário essa união não só quando nos sentimos ofendidos, mas também quando precisamos ajudar uns dos outros, ninguém prospera sozinho. 

Nós temos mais de uma luta, devemos priorizar qual delas é mais importante para nós e para o nosso futuro e para o futuro dos que virão depois de nós. E por fim...

“230. O tolo se ocupa com as afazeres de todos menos com os seus próprios. (HS, c.14)”

Concluída essa reflexão, espero que tenha sido dado o recado. E aos que se preocupam demais conosco e que atrapalham nosso caminho, que não haja Friðr para eles e que Loki se divirta fazendo o caos na vida deles. Vamos fazer o que precisa ser feita, cada qual da melhor forma que souber fazê-lo.

As frases citadas nesta postagem fazem parte de uma coletânea de trechos de sabedoria inspiradas nas sagas islandesas.

O nome do texto é Sögumál e seu trabalho é atribuído a Álfta Óðinssen.

Aqui segue o Link direto de acesso ao texto (em inglês):


E aqui segue o site que é atribuída a fonte do texto rico em sagas e demais informações (em inglês):


Obrigado pelo seu tempo e interesse, façam bom proveito das reflexões de dos links. Tenham um ótimo fim de semana e até a próxima postagem. Far Vel!

- Heiðið Hjarta.